Por Claudio Dirani
Longa estaria perto dos R$ 40 milhões
“Sua missão, caso você decida aceitá-la, é enfrentar seu destino”
Esta é uma das frases mais famosas de uma das franquias mais famosas de todos os tempos: Missão Impossível. No caso, do quarto capítulo: Protocolo Fantasma.
Aí você pergunta – mas o que isso tem a ver com a bilheteria do filme extremamente doutrinário Ainda Estou Aqui?
A explicação é mais fácil do que a conclusão. Vamos passear pelas notícias sobre o longa, incluindo a de que a produção de Walter Salles teria atingido mais de R$ 30 milhões nas bilheterias do país, quebrando toda a banca.
Ainda estou Aqui e a crise do cinema nacional
Há menos de dois meses, a seguinte informação pipocou pelos sites mais populares do país: “Apesar de ingressos mais baratos, cinemas brasileiros registram o segundo pior público do ano em fim de semana”.
Sim, meus amigos. O cinema nacional (e o internacional, idem) não vive sua melhor fase. De acordo com a Comscore, em 24 de setembro, as salas exibidoras enfrentaram o seu segundo pior público do ano, com R$ 16 milhões de renda e apenas 728 mil espectadores.
Tendo como base a decadência das vendas de ingressos, a notícia de que Ainda Estou Aqui – com seu roteiro embasado no regime militar e no sumiço do deputado Rubens Paiva, como suposta vítima – está causando um furor comercial é, no mínimo, duvidosa.
Vamos para os dados espalhados pela mídia tradicional.
De acordo com relato da CNN, o filme nacional estrelado por Fernanda Torres se tornou a segunda maior bilheteria de um filme nacional pós-pandemia. Isto é: teria sido o melhor desempenho desde o fim de 2022, englobando 2 milhões de pessoas até quarta-feira (27).
Veja só o que está no texto do site da emissora por assinatura:
“Estrelado por Fernanda Torres, “Ainda Estou Aqui” superou “Os Farofeiros 2”, que atraiu 1,9 milhão de espectadores. O filme ocupa agora o segundo lugar, ficando atrás apenas de “Minha Irmã e Eu“, que chamou 2,3 milhões de brasileiros para as salas de cinema”.
A reportagem continua:
“Vale destacar que “Ainda Estou Aqui” alcançou a marca de dois milhões de espectadores em menos de um mês desde sua estreia, que aconteceu em 7 de novembro. A produção brasileira, inclusive, ultrapassou o filme “Wicked” e se tornou o mais visto da última semana no Brasil”.
Nossa investigação continua, rumo ao número oferecido pela Comscore, divulgados pelo site G1 e pelo mais confiável site do ramo: o Box Office Mojo.
Ao contabilizar os dados da semana referente a 21 e 24 de novembro, o portal do grupo Globo aponta que Ainda Estou Aqui ficou na frente do blockbuster da Universal Pictures Wicked, marcando R$ 8,9 milhões, contra R$ 7,8 milhões do rival sobre as bruxas de Oz.
O mesmo texto, assinado pela equipe do G1, crava os números impressionantes:
“Filme de Walter Salles, que tenta vaga na categoria de Melhor Filme Internacional, soma R$ 38,7 milhões em arrecadação no país”.
Ao convertermos o número oferecido pela Comscore, chegamos à conclusão que o Box Office Mojo recebeu o montante da mesma fonte, totalizando US$ 6,7 milhões, ou R$ 39,6 milhões de Haddads sem picanha, pela conversão de 29 de novembro.
Dados da Comscore
Como diz o primeiro mandamento do jornalista, é preciso checar as fontes. Então, o Se Liga Nerd procurou o Comscore para conferir os detalhes das bilheterias nacionais, que carecem de transparência se compararmos com as fontes norte-americanas.
Ao checar no endereço eletrônico do portal, temos a seguinte definição: “A Comscore é uma parceira confiável para planejar, transacionar e avaliar mídia nas plataformas. Com uma vasta visão do público que combina TV digital, linear, over-the-top (OTT) e audiência teatral, combinamos medição confiável de terceiros com ciência de dados, sendo transformadora para fornecer insights sobre o comportamento de várias telas e ajudar os negócios a crescer”.
A bela apresentação, no entanto, não impede que haja dúvida ao buscarmos pelos dados oficiais. O site requer inscrição de órgãos da mídia profissional, o que exclui diversas modalidades e publicações.
Ainda assim, insistimos. Na seção de imprensa, obtivemos um e-mail que diz ser reservado sobre a apuração de dados. Isto é: à espera de que eles incluam os números das bilheterias.
Sem estar ciente se a companhia será atendida por um brasileiro ou americano, escrevi em inglês o seguinte texto:
Caros amigos da Comscore:
“Sou repórter do site especializado Seliganerd.com, e precisaria de dados referentes à bilheteria do filme Ainda Estou Aqui, se possível detalhado por região do Brasil e da franquia que exibiu o longa (Cinemark, UCI, etc). Seria possível receber esses dados o mais breve possível? Obrigado por antecipação”
Enquanto isso não acontece, vale a pena comparar – caso os dados sejam exatos – o desempenho de Ainda Estou Aqui com filmes nacionais e estrangeiros recentes.
Top Gun – Maverick, por exemplo, completou seu percurso nos cinemas brasileiros, anotando R$ 100 milhões de bilheteria. Ainda Estou Aqui, em quatro semanas, chegou perto de R$ 40 milhões – algo realmente digno de nota, caso confirmado.
Já as três badaladíssimas comédias que compõem a trilogia Minha Mãe É Uma Peça, que é pura diversão e não se apoia em política ou questões de história, se consagrou como uma das maiores franquias nacionais de todos os tempos. arrecadando R$ 49 milhões, R$ 124 milhões e R$ 120 milhões, respectivamente. Caso os números de Ainda Estou Aqui batam, o drama está bem perto de chegar na arrecadação do Minha Mãe é Uma Peça original, lançado em 2013 (sem correção inflacionária).
Tem dinheiro público em Ainda Estou Aqui?
Segundo uma breve pesquisa sobre quem bancou o longa de Walter Salles, temos uma lista de aproximadamente 11 patrocinadores, incluindo alguns de interesse, ao menos, regional: Crédito Agro BDMG e Sebrae – ambos de Minas Gerais. Entretanto, após longa investigação, não há indícios de que haja incentivo fiscal (leia Rouanet) no borderô do filme brasileiro.
O que existe, mesmo, é um forte apoio nacional. A Empresa Brasileira de Comunicação – administrada pelo governo Lula – não para de alardear que Ainda Estou Aqui poderá estar entre os competidores do Oscar em março de 2025. Antes disso, a produção terá de convencer os membros da academia e aparecer na lista de pré-selecionados em 17 de dezembro. Já a lista definitiva está programada para 17 de janeiro do ano que vem.