James Cameron, o homem que passou as últimas duas décadas fazendo filmes sobre alienígenas azuis de três metros, decidiu que agora é o momento perfeito para dar “lições de coragem moral” à Christopher Nolan. Em entrevista recente à Deadline, o diretor de Avatar chamou Oppenheimer de “um pouco de fuga moral” por não mostrar graficamente os horrores de Hiroshima e Nagasaki.
Pause para a ironia ensurdecedora.
O Pregador Sem Púlpito

Cameron, aos 70 anos, parece ter descoberto súbitamente que cinema pode ter responsabilidade social. “Não gosto de criticar o filme de outro cineasta, mas há apenas um breve momento em que ele vê alguns corpos carbonizados na plateia e então o filme continua mostrando como isso o comoveu profundamente”, declarou Cameron, antes de adicionar que Nolan “esquivou-se do assunto”.
É fascinante ver o diretor de Piranha 2, True Lies e Titanic — filmes não exatamente conhecidos por sua profundidade moral — posicionando-se como árbitro da coragem cinematográfica. Como bem observado por críticos, Cameron “passou as últimas duas décadas efetivamente fazendo videogames como filmes na franquia Avatar” e “é indiscutivelmente a última pessoa que deveria oferecer críticas sobre a profundidade moral do trabalho de outros diretores”.
A Filmografia da Hipocrisia
Vamos aos fatos: a filmografia de Cameron inclui:
- Piranha 2: Terror com peixes voadores
- O Exterminador do Futuro: Robôs malvados do futuro
- Aliens: Marines espaciais vs. alienígenas
- True Lies: Schwarzenegger como espião com problemas conjugais
- Titanic: Romance no navio que afunda
- Avatar: Pocahontas com alienígenas azuis
“Do ponto de vista intelectual e consequencial, não é como se ele já tivesse feito um A Lista de Schindler ou A Zona de Interesse”. Até mesmo Nolan fez Dunkirk, um filme de guerra genuinamente reflexivo sobre sobrevivência e heroísmo.
O Projeto “Fantasmas de Hiroshima”
Cameron planeja adaptar o livro de Charles Pellegrino, prometendo fazer “pelo que aconteceu em Hiroshima e Nagasaki o que Steven Spielberg fez com o Holocausto e o Dia D com O Resgate do Soldado Ryan”.
Mas aqui está o detalhe revelador: Cameron admite que “não escreveu uma palavra do roteiro ainda” e está “fazendo anotações há 15 anos”. Quinze anos de anotações, mas só agora, após o sucesso de bilheteria de Oppenheimer, ele decidiu que é urgente contar essa história?
A Defesa de Nolan
Christopher Nolan já respondeu a essas críticas anteriormente, explicando que “o filme apresenta a experiência de Oppenheimer subjetivamente. Sempre foi minha intenção manter-me rigidamente a isso”. É uma escolha artística deliberada focar na perspectiva psicológica do criador da bomba, não um “desvio moral”.
Spike Lee fez críticas similares em 2023, mas pelo menos Lee tem um histórico de fazer filmes com comentários sociais contundentes. Cameron? Seu filme mais “político”, Avatar, “mal apresenta protagonistas humanos e é acusado de copiar sua história de obras como Dança com Lobos e FernGully”.
O Timing Suspeito
Curiosamente, Cameron escolheu este momento — quando precisa promover Avatar 3 e está “atualmente preso a escrever e dirigir Avatars 3, 4 e 5” — para criticar um filme que ganhou 7 Oscars e quase 1 bilhão de dólares em bilheteria.
Quando perguntado diretamente pela Deadline sobre o que ele acrescentaria após Oppenheimer, Cameron respondeu com uma crítica antes mesmo de explicar sua visão. “OK, eu me candidato. Eu farei isso, Chris. Sem problemas. Você vem à minha estreia e diz coisas boas…” — uma resposta que soa mais como competição de ego do que preocupação genuína com as vítimas de Hiroshima.
A Verdadeira Fuga Moral
A verdadeira fuga moral aqui não é de Nolan — é de Cameron, que após décadas fazendo entretenimento escapista bilionário, agora quer posar de cineasta socialmente consciente. “Com exceção do altamente divertido, mas desconcertantemente cruel True Lies, pode-se dizer com segurança que James Cameron é um humanista”, defende um crítico. Mas ser humanista não é o mesmo que ter coragem moral cinematográfica.
Conclusão: O Imperador Está Nu (e É Azul)
James Cameron criticando Christopher Nolan por falta de coragem moral é como Michael Bay criticando Terrence Malick por falta de sutileza. É válido querer contar a história das vítimas de Hiroshima — é uma história importante que merece ser contada. Mas fazer isso enquanto ataca o trabalho cuidadoso e reflexivo de outro diretor, especialmente vindo de alguém cuja maior contribuição recente ao cinema foi ensinar-nos sobre as tranças capilares dos Na’vi, beira o absurdo.
Se Cameron realmente se importa com essa história, que a conte. Mas que o faça sem a necessidade de diminuir o trabalho de outros para elevar o seu. Afinal, “não sei se o estúdio ou Chris sentiram que era um terceiro trilho que não queriam tocar, mas eu quero ir direto ao terceiro trilho. Sou simplesmente estúpido desse jeito”, disse Cameron.
Pelo menos nisso, podemos concordar com ele.
Avatar 3 estreia em 19 de dezembro de 2025. Fantasmas de Hiroshima não tem data de lançamento — provavelmente porque ainda não existe.
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