
Acabei de sair da sessão de Quarteto Fantástico: Primeiros Passos (2025), dirigido por Matt Shakman, e sigo digerindo uma mistura de entusiasmo e frustração. O longa marca oficialmente a estreia da “Primeira Família” no MCU, mas não exatamente no universo que conhecemos. A trama se passa na Terra-828, uma realidade alternativa que abraça com força total uma estética retrô-futurista inspirada diretamente nos traços grandiosos de Jack Kirby, com arquitetura cósmica, máquinas monumentais e visuais psicodélicos que transportam o público para uma Nova York que parece saída de um gibi clássico da Marvel. É um charme visual, sem dúvida — mas por baixo desse verniz estilizado, há uma narrativa que vacila justamente onde deveria voar alto.

O maior acerto está no elenco. Pedro Pascal, Vanessa Kirby, Joseph Quinn e Ebon Moss-Bachrach formam um grupo que convence como família. Há calor humano e conflitos palpáveis entre eles, com destaque absoluto para Vanessa Kirby, que dá alma à Sue Storm em cada cena, especialmente quando tenta mediar a tensão crescente entre Reed e Johnny. Joseph Quinn surpreende ao entregar um Tocha Humana mais emocional e menos fanfarrão, algo que traz frescor ao personagem. Ebon Moss-Bachrach é quem mais emociona como Ben Grimm — sua transformação na Coisa é melancólica, visceral, e ainda assim carregada de humanidade.

Já Pedro Pascal, embora carismático e magnético, entrega um Reed Richards que foge um pouco da rigidez cerebral que muitos fãs — inclusive eu — associam ao personagem nos quadrinhos. Ele funciona bem como o explorador apaixonado pelo desconhecido, mas me pareceu mais aventureiro do que cientista metódico. Senti falta de uma liderança mais firme por parte dele, principalmente nos momentos críticos da narrativa. Em várias cenas, inclusive, é Sue Storm quem assume a responsabilidade emocional e o equilíbrio do grupo, o que funciona bem graças à força da personagem, mas deixa Reed um pouco apagado no papel que, tradicionalmente, é seu.

Visualmente, o filme é um espetáculo. Os cenários práticos da Fundação Baxter, a nave construída com miniaturas e o design de produção inspirado em Kirby criam um MCU alternativo que vibra estilo e identidade própria. A trilha de Michael Giacchino reforça esse espírito de ficção científica clássica, ganhando ainda mais peso nas cenas cósmicas que envolvem Galactus. E aqui entra uma das minhas maiores frustrações.
Ralph Ineson, com sua voz grave e presença imponente, encarna um Galactus assustador e quase lovecraftiano. Visualmente, ele impressiona, com efeitos que o colocam como uma força da natureza pairando no vazio do cosmos. Mas o filme não se aprofunda no personagem — ele aparece como uma ameaça, mas sem motivação clara, sem peso dramático. É uma figura, e não um antagonista. O mesmo vale para a Surfista Prateada de Julia Garner, apresentada como Shalla-Bal. Sua versão feminina tem um visual poderoso e participação pontual em boas cenas de ação, mas falta desenvolvimento. Ela entra e sai da trama sem contexto emocional, como se fosse um teaser de uma história maior que nunca chegou.

O resultado é que dois personagens com potencial para serem inesquecíveis acabam sendo subutilizados. Galactus parece mais um símbolo do que uma ameaça real, e a Surfista, uma presença enigmática que mal arranha a superfície de quem poderia ser. Isso esvazia o impacto do clímax — que precisava de mais tensão, mais peso, mais consequência.
Ainda assim, Primeiros Passos serve como um respiro dentro de um MCU que vinha desorientado. Ao optar por um tom mais intimista, leve e esperançoso, o filme resgata o lado mais humano da franquia, com conflitos centrados na dinâmica familiar e no desejo de explorar, e não apenas combater. A ambientação isolada da Terra-828 ajuda a construir essa identidade própria, e as menções à Fase 6 e Vingadores: Doomsday funcionam como iscas inteligentes — presentes, mas sem roubar o foco.

O problema é que tudo parece vir apressado demais. Com apenas 1h55 de duração, o longa acelera onde deveria respirar. E ainda incomoda o corte do vilão Fantasma Vermelho, vivido por John Malkovich, que havia sido anunciado e prometia um antagonista excêntrico e ameaçador — mas acabou completamente excluído do filme. Uma ausência sentida, que dá a impressão de que algo interessante ficou pelo caminho.

Quarteto Fantástico: Primeiros Passos é, acima de tudo, uma promessa. Ele entende a essência do grupo como exploradores e como família, apresenta um visual diferenciado, e conta com atuações que brilham. Mas também mostra que essa nova fase ainda está encontrando seu ritmo. Saí da sessão empolgado com o potencial — mas também com a clara sensação de que esse filme preferiu jogar seguro onde deveria ousar, e deixou seus vilões maiores que a vida com muito menos do que mereciam.
Nota: 7/10